Era uma manhã de terça, no ar o cheiro de chuva, ele parou por um minuto na calçada que dava para o quintal. Um enorme quintal, cercado por muros altos de pedras grandes que expressavam o sentido de força. Árvores frondosas, que devido a chuva da madrugada anterior resplandeciam a mais bela e vivida cor verde já vista, alguns passarinhos até arriscaram uns acordes, mas o som do silêncio misturado com a presença das majestosas árvores de eucalipto e aquele tapete esmeralda de grama venciam qualquer outra distração. Respirou fundo, fitou bem onde iria enterrar a caixinha de metal que segurava com tanto cuidado nas mãos, que apesar de serem mãos de alguém de 12 anos, ainda sim eram mãos grandes para uma caixinha tão pequena mas com um valor tão grande, que até mesmo o mais sábio dos sábios questionaria-se como tanto pode ter cabido em tão pequeno refratário.
Ele caminhou a passos lentos e curtos, com os pés descalços até a paineira que se encontrava majestosamente bem ao centro do quintal... ajoelhou-se aos pés da imponente árvore e encarou bem a cova que teu pai tinha feito como ele lhe havia pedido no dia anterior. Seus olhos queriam, mas as mãos ainda relutavam em o fazer, alguns minutos ali, parado a lembrar algumas coisinhas, e foi o suficiente para que delicadamente ele estendesse os braços até o fundo da cova, depositando o "caixãozinho" lá... com alguma lágrimas secas ele foi sobrepondo aos poucos punhados e punhados de terra, que faziam sumir aquela caixinha enferrujada... Depois de um tempo, o sol ressurgiu iluminando os claros olhos do menino, que ainda tinham resquícios de algumas lágrimas. Ele levantou-se, mirou por mais uns segundos o local que havia enterrado sua tão preciosa caixinha e que agora não passava de um circulo de terra em meio aquela grama... Suspirou, sem perceber enxugou a lágrima que descia no seu rosto com a mão ainda suja de terra, pensou mais um pouco, e ninguém arriscaria imaginar o que se passava na mente daquela criança...
Virou-se e no mesmo ritmo que caminhou até a paineira ele voltou pra dentro de casa, enquanto a caixinha estava lá e sentia que pra sempre ficaria, vendo seu dono se distanciar como flash de uma memória que jamais retornaria. A caixinha sentiu-se sozinha por um momento, mas percebeu depois que a constante presença de seu conteúdo próxima ao garotinho o consumia todo dia, consumia sua felicidade, seu amor e seu ar de inocência, sem esquecer do mais importante: sua crença de que tudo sempre fica bem no fim das contas. A caixinha percebeu mais ainda, notou que não havia motivos para entristecer-se, pois ela sabia humildemente o quanto representava ao garotinho, sabia o quanto os dois se amavam e pra sempre se amariam, mas um garoto não poderia amar uma caixinha e uma caixinha jamais amaria um garoto. Por isso dentro dela o rapazinho guardou tudo aquilo que mais tinha de precioso, selou e confiou a caixinha guardá-los como simbolo do amor que pulsava entre eles dois. O que havia dentro da caixinha? Talvez nada, ou talvez tudo, na verdade encontrava-se ali recortes de um passado que jamais seriam colados novamente.
Diego Anderson M'M'